domingo, 18 de setembro de 2011

Não sei quantas almas tenho

Não sei quantas almas tenho
Cada momento mudei
Continuamente me estranho
Nunca me vi nem acabei.

De tanto ser, só tenho alma
Quem tem alma não tem calma.

Quem vê é só o que vê
Quem sente não é quem é.

Atento ao que sou e vejo
Torno-me eles e não eu
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.

Sou minha própria paisagem
Assisto à minha passagem.

Diverso, móbil e só
Não sei sentir-me onde estou.

Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser
O que segue não prevendo
O que passou a esquecer.

Noto à margem do que li
O que julguei que senti.

Releio e digo: "Fui eu?"
Deus sabe, porque o escreveu.

(Fernando Pessoa)

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