domingo, 26 de junho de 2011

Mistérios

Fotografias amareladas e envelhecidas, rugas que se acumulam, marcas da ação do tempo. Cem anos, cem dias, minutos, segundos, instantes, momentos...

Antigamente, as fotografias carregavam consigo as marcas da passagem do tempo. Nos tempos atuais, com tanto aparato tecnológico a nos rodear, muitas vezes não sobra tempo para refletirmos sobre o escorrer do tempo, sobre a fugacidade da matéria, sobre os mistérios da existência. Fotos digitais não
mais amarelam com o tempo.

Tempo, vida, a busca por um sentido. Quais são as coisas que realmente contam, quais são as coisas que realmente importam? O tremendo e fascinante Mistério: o que é a Vida, o que é o Tempo?

Da criança que ontem foste, o que se preservou?

A vida é um instante, um minuto, um sopro...

“O homem é semelhante ao sopro da brisa, seus dias são como a sombra que passa.” (Salmos 144,4)

Dos teus primeiros anos de vida, quais as lembranças que ainda te acompanham? Quantas velas já apagaste, quantas ainda serão acesas à espera do teu sopro? Quantos presentes ganhastes? O que foi que fizeste com os bens e os dons com que a vida generosamente te agraciou?

Dizemos pais, dizemos filhos, dizemos irmãos. Relações familiares, vínculos que moldam os sentimentos profundos. Caminhos, amores, destinos...

Do nosso primeiro sopro ao último, quais virtudes cultivaremos, quantas belas ações realizaremos? Quantos sonhos sonharemos? Quantas dores vivenciaremos?

“Ao longo do tempo alternam-se obscuridade e luz, e o esquecimento possui
em nossa vida uma porção tão grande como a lembrança...”

“De nossa felicidade conservamos somente uma impressão superficial, e mesmo os golpes mais dolorosos hão de se cicatrizar com o tempo.” (Thomas Browne)

Numerosos mistérios nos perseguem e assaltam durante a nossa breve passagem por esta vida terrena. Mistérios que nos acompanham e que demarcam os momentos decisivos da nossa vida. O nascimento é um mistério, um novo ser, uma nova vida. Os avanços dos conhecimentos médicos e científicos permitem acompanhar todas as fases do desenvolvimento humano. Porém, quão pouco compreendemos a respeito do processo da origem da vida.


Duas células reprodutivas
de simples constituição
que se encontram e resultam
no milagre da vida.







Que sabe a ciência acerca da nova vida que se desenvolve em silêncio no ventre materno?
Qual será a cor dos olhos do novo ser que em breve nascerá? Qual será a sua altura? Quais serão seus dons, vocações e talentos? Que sonhos sonhará, que ideais abraçará?




Amores, tristezas, desilusões, alegrias, esperanças... Mistérios...

Outro mistério que nos envolve desde o nosso primeiro respirar até o nosso último suspiro é o tempo. Como nos relacionamos com o tempo? Que uso fazemos da experiência acumulada de todos os séculos que nos antecederam?

Há tempos e tempos...

“O tempo natural do crescimento de uma árvore gigante pode demorar 50 anos. O tempo tecnológico de sua derrubada com a motosserra pode durar apenas 5 minutos.”

“Quanto tempo precisamos para crescer em maturidade, sabedoria, e conquistar o próprio coração? Às vezes, uma vida inteira de 80 anos é curta demais.
O tempo interior não obedece ao tempo do relógio.” (Leonardo Boff)

Grãos de areia, que vão suavemente fluindo por entre os nossos dedos...

E os sonhos sonhados, que são senão mistérios? Quais os dedos que pintam a infinita tela dos sonhos? Quem algum dia decifrará o mistério dos sonhos?
O que em nós sonha os sonhos que sonhamos? E quão pouco guardamos na memória daquilo que nos sonhos vivenciamos...

“Nós somos feitos de sonhos.” (Shakespeare)
“A alma é feita de sonhos.” (Rubem Alves)

“Confiai nos sonhos, porque neles se oculta a porta da eternidade.”
(Khalil Gibran)

E o amor...
O que sabemos acerca dos assuntos do coração? O que nos leva a amar alguém? Por que a simples presença, a simples visão, de uma pessoa específica é capaz de iluminar, tal qual o sol, a nossa hora, o nosso dia? O que sabemos sobre o amor? Que sentimento é este capaz de transformar o mundo num lugar um pouco menos frio?

“O amor não se define; sente-se.” (Sêneca)

“O amor só é lindo quando encontramos alguém que nos transforme no melhor que podemos ser." (Mário Quintana)

“Aquilo que a memória amou fica eterno.” (Adélia Prado)

E a fé... Que força é esta, capaz de remover montanhas?

Mistério...

“Fé não é acreditar em seres do outro mundo, anjos, céu, inferno e nem mesmo Deus. Fé é uma atitude perante a vida, intraduzível em palavras."

“Encontramos a fé principalmente nas crianças. Elas vivem o dia-a-dia. Quem tem essa tranqüila experiência de viver o cotidiano são apenas as crianças.
À medida que ficamos adultos, a gente começa a perder esta simplicidade e
a passar a viver na ansiedade.”

“Fé, tal como eu a entendo, é viver ousadamente, tomando riscos, sendo livre, lutando por causas bonitas, plantando jardins. Quem planta um jardim anuncia
o Messias.” (Rubem Alves)

Ser livre, lutar por causas bonitas, plantar jardins...

E a jornada terrena, que se iniciara com o mistério do nascimento, findará um belo dia com o mistério da morte.

“Quem vive deve morrer, passando da natureza para a eternidade.” (Shakespeare)

E a morte nos dirá: Sente-se, vamos conversar. Chegou a hora da avaliação,
da tua prestação de contas.

Como foi que viveste as tuas horas, com o que foi que ocupaste os teus dias? Quantas lágrimas enxugaste? Quantas dores atenuaste? Quais as sementes
que plantaste? Qual o decaído que auxiliado pela tua mão amiga conseguiu se reerguer? Quais atos teus fizeram os anjos no céu de tristeza chorarem?
E quais atos teus lhes embelezaram o semblante com um suave sorriso de aprovação?

E o que sabemos sobre a eternidade?

“Quando o homem fala da eternidade, é como o cego que fala da luz.”
(São Gregório)

Sob a perspectiva da eternidade, percebemos a fragilidade absoluta das glórias mundanas. Diante da eternidade, poucas coisas apresentam valor verdadeiro:
- o coração puro e íntegro;
- a alma nobre, celestina;
- as ações retas, as belas realizações...

“Sobre tudo o que se deve guardar, guarda o teu coração, porque dele procedem as saídas da vida." (Provérbios 4:23)

“Bem-aventurados os puros de coração...” (Jesus Cristo)

Procurar escrever, com a tinta do Amor, a história dos nossos dias. Numerosos são os mistérios que nos rodeiam durante a nossa breve passagem por esta existência terrena. A vida se reveste de um significado mais pleno à medida que ousamos mergulhar no mais profundo de nós mesmos, em busca daquilo que não se vê, daquilo que nos transporta do estado de sono para o nosso despertar. Procurar ver, com os olhos do coração, o Invisível; estender a mão
em direção ao inatingível. Tomar consciência do Ser que está sempre aqui.

Ensinar às futuras gerações a linguagem da Compaixão, do Amor e do Perdão. Iniciar em nós mesmos a transformação que queremos ver na nossa sociedade, no mundo que nos rodeia. Praticar a Caridade, semear a Justiça, almejar a Purificação. Ser solidário, procurar servir ao próximo, compartilhar bens, dons
e talentos.

O tempo que desenha rugas também estende diante de nós infinitas oportunidades. Oportunidade de servir, de nos purificarmos e de crescermos espiritualmente.

Oportunidade de, ao fim de cada dia, fazermos a contabilidade espiritual,
a fim de verificar se tivemos ganhos ou perdas no nosso patrimônio eterno.

Ter olhos para a Luz que jamais se apaga...

Ouvidos para a Canção que não esmorece...

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